Por Andréia Wojcicki Ruberti e Rodrigo M. Garcia, bibliotecários da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin da USP
Uma biblioteca de obras raras e especiais é de extrema importância para uma universidade, pois ela contém obras que representam, como patrimônio, a história, cultura e a memória de um país ou região. Essas obras, muitas vezes únicas e insubstituíveis, representam um registro histórico de períodos importantes da humanidade. Além disso, muitas delas são fontes de informação primárias, ou seja, são as primeiras fontes de informação sobre determinado assunto, acontecimento ou forma de expressão de uma determinada época.
Inaugurada em 2013, a Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) comemora 10 anos de existência na Universidade de São Paulo. A iniciativa surgiu ainda em 2005, com a doação realizada por José Mindlin, de parte de sua coleção brasiliana pessoal. Conforme o professor István Jancsó, na época “a ideia era de se criar dispositivos que envolvessem o diálogo entre as diversas unidades da USP”, ou seja, foi pensada para configurar-se como um centro interdisciplinar de Informação e Documentação.
Como “dispositivo e espaço interdisciplinar”, a BBM cumpre seu papel institucional em diversas frentes na formação de estudantes e pesquisadores de diversas áreas, seja no tratamento, preservação e disponibilização destas obras, seja no uso de seus conteúdos, para a realização de estudos avançados e para a produção de conhecimento técnico-científico. Além disso, promove o acesso e a preservação destas obras para toda a sociedade e gerações futuras.
Para cumprir suas finalidades, uma das atividades é o processo de conservação que começa no Laboratório de Conservação Preventiva Guita Mindlin, coordenado pela bibliotecária e conservadora Andréia Wojcicki Ruberti. Responsável pela análise do estado de conservação das obras do acervo e do planejamento dos procedimentos de higienização e reparos das mesmas. É uma atividade importante para que as obras possam ser mantidas em bom estado de conservação ao longo do tempo. A preservação da forma e do conteúdo das obras caminham juntas, pois o patrimônio histórico e a herança cultural somente sobrevivem se ambos os aspectos forem tratados com a importância e com as peculiaridades existentes. Os espaços físicos, que recebem as obras, também são frequentemente monitorados para garantir as condições mais adequadas possíveis de temperatura e umidade que auxiliem na melhor conservação das coleções. São desenvolvidas políticas de conservação preventiva e interventiva, bem como políticas de prevenção de riscos à biblioteca (como acidentes por fogo, água, infestações, entre outros).
Além das atividades de conservação e preservação, para cumprir sua finalidade de proporcionar irrestrito acesso de seu acervo a estudantes, pesquisadores e ao público em geral, a estratégia adotada foi o desenvolvimento de uma Biblioteca Digital, a BBM Digital, coordenada pelo bibliotecário Rodrigo M. Garcia. A partir do trabalho de digitalização realizado na BBM, que tem a proposta de recriar, tanto quanto possível, as características materiais da obra original, são disponibilizadas obras em domínio público, possibilitando às pessoas de diversas partes do mundo conhecer, ler e estudar materiais, muitas vezes únicos e raros, como livros, manuscritos, mapas, gravuras e outras formas de documentos raros e históricos. A disponibilização e o acesso on-line a estas obras também é de grande importância, permitindo a realização de pesquisas mais amplas e profundas, pois possibilita a análise de detalhes que muitas vezes passam despercebidos durante a leitura convencional. Na avaliação de Garcia, mestre em Ciência da Informação pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp) – que atua no Desenvolvimento, Gestão e Coordenação de Projetos de Tecnologia da Informação e Comunicação -, o desenvolvimento de bibliotecas digitais a partir de objetos digitalizados é a melhor estratégia que se conhece no momento para fins de preservação do objeto original, se tornando uma ferramenta valiosa na democratização do conhecimento e da cultura.
No primeiro dia do Seminário BBM 10 anos: uma biblioteca viva, em 16 de maio, teremos a oportunidade de discutir diversas temáticas, entre elas as atividades de conservação e preservação, com a mesa Homenagem a Guita Mindlin: a conservação do acervo bibliográfico; e o desenvolvimento de bibliotecas digitais, com a mesa Os desafios das bibliotecas digitais de obras raras, com profissionais e pesquisadores da área.
Cada livro preservado e digitalizado é uma oportunidade de disseminar conhecimento e promover a cultura. Assim, gostaríamos de celebrar estes 10 anos expandindo a famosa frase de Michel de Montaigne (1533-1592), usada pelo bibliófilo José Mindlin em seu famoso ex-libris para expressar sua paixão pelos livros ao afirmar: “Não faço nada sem alegria”. Formada por um acervo particular colecionado por décadas, desde 2013 a Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin da USP se expande para o público, oferecendo acesso à cultura e ao conhecimento, movendo a alegria particular de Mindlin para um movimento coletivo e plural: “Não fazemos nada sem alegria”.
Matéria originalmente publicada no Jornal da USP.