Um marco do design gráfico brasileiro – Revista Senhor

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A revista Senhor, publicada entre 1959 e 1964, se insere em um contexto de profundas modificações políticas, econômicas e culturais vivenciadas no Brasil, que entoavam um tempo de inédita transformação da sociedade. A publicação surge como um projeto maior da Editora Delta, que pretendia elaborar um veículo que inaugurasse um circuito brasileiro de revistas culturais. Nesse período a modernização também alcança a indústria gráfica, promovendo avanços qualitativos em relação às possibilidades de impressão e à melhoria no padrão dos materiais utilizados. Tal conquista abre caminho para novas experimentações no campo das artes gráficas e as eleva a um novo patamar, além de permitir maior adequação entre a identidade visual de uma publicação e o público almejado. No caso da revista Senhor, as inovações tecnológicas da época, somadas à disponibilidade de recursos financeiros e à decisão de seguir modelos de publicações internacionais (p. ex. as revistas americanas Esquire e New Yorker), permitiram que a revista alinhasse seu projeto gráfico à sofisticação de seu conteúdo.

"Diagramação, imagem e texto estabelecem um diálogo onde os conteúdos imagéticos não cumprem função meramente ilustrativa, mas sintetizam, refletem e propõem interpretações para os conteúdos textuais"

“Diagramação, imagem e texto estabelecem um diálogo onde os conteúdos imagéticos não cumprem função meramente ilustrativa, mas sintetizam, refletem e propõem interpretações para os conteúdos textuais”

 

As características visuais da revista Senhor vai ao encontro de sua modernidade textual. O projeto visual é composto pelos mais diversos elementos gráficos e tipos de papel, que buscam contribuir para a consolidação da identidade da revista, estabelecendo o design como parte fundamental na definição de seu perfil. A diagramação da revista não obedece a um grid (malha visual composta por retângulos usada para ordenar elementos gráficos) rígido e pré-estabelecido, em vez disso, a publicação propõe uma solução gráfica para cada assunto e tipo de texto. Assim, diagramação, imagem e texto estabelecem um diálogo onde os conteúdos imagéticos não cumprem função meramente ilustrativa, mas sintetizam, refletem e propõem interpretações para os conteúdos textuais.

A cada edição da revista é possível perceber uma grande variação de recursos visuais: fotografias, gravuras, pinturas e ilustrações, além de diferentes tratamentos das imagens, demonstram um esforço no sentido de criar uma linguagem específica para cada conto, reportagem, ensaio etc. Contudo, a ampla gama de caminhos trilhados não foge a um projeto único e maior de identidade da revista. Exemplo disto é o fato de cada número da revista utilizar uma paleta própria de cores e tonalidades, que permeia sua capa e miolo.

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“A cada edição da revista é possível perceber uma grande variação de recursos visuais: fotografias, gravuras, pinturas e ilustrações”

Encontro entre a subjetividade expressiva das artes plásticas e a objetividade necessária de um projeto gráfico para revista, a revista Senhor trouxe soluções arrojadas, com destaque para o perído que vai de março de 1959 a janeiro de 1961, que teve como diretor de arte o artista plástico Carlos Scliar, com quem colaboravam o pintor Glauco Rodrigues e o cartunista de Jaguar. Com o objetivo de transmitir o complexo e multifacetado conceito da revista por meio de seu projeto gráfico, os diretores de arte da revista buscaram criar uma estrutura visual que se adequasse à ideia de cada texto ou serviço e mantivesse a identidade da publicação. Entretanto, dificuldades financeiras ao longo de sua existência impediram que a revista sustentasse seu projeto gráfico ambicioso por muito tempo. Apesar da progressiva redução das experimentações e do apuro gráfico, a revista Senhor deixou um legado inquestionável para o design gráfico brasileiro, marcando presença como referência incontornável para edição de periódicos no país.   

Mais sobre o tema:

Lucy Carlinda da Rocha Niemeyer. O design gráfico da revista Senhor: uma utopia em circulação. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. (Tese de Doutorado em Comunicação e Semiótica), 2002.

 

Maria

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